A crise financeira de 2008, popularmente chamada de crise do subprime, foi um dos piores desastres econômicos globais dos últimos anos.
Originada nos EUA, ela teve início com o estouro da bolha de hipotecas no mercado financeiro e se alastrou pelo restante do mundo, com efeitos catastróficos e duradouros.
Os instrumentos financeiros envolvidos são bem complexos, mas o processo que levou à crise pode ser facilmente analisado a partir de incentivos econômicos e forças de mercado.
Neste artigo, vamos explicar de forma didática o surgimento da bolha hipotecária nos EUA, seu estouro e as consequências para a economia global.
Confira!
Indice
A crise do subprime foi o resultado do estouro de uma bolha de investimentos massivos em hipotecas nos EUA que cresceram ao longo dos anos 2000. As hipotecas são uma forma de financiamento imobiliário comum nos EUA, em que o imóvel é dado como garantia ao banco caso o tomador não consiga pagar as dívidas.
Já o nome “subprime” refere-se a empréstimos concedidos a pessoas com alto risco de crédito, isto é, com pouca estabilidade financeira e credibilidade para pagar contas.
Por natureza, empréstimos subprime são investimentos extremamente arriscados e com altíssima chance de default — termo financeiro para o universalmente conhecido “calote”.
Em linhas gerais, a bolha surgiu porque o crescente interesse por rendimentos de hipotecas deu origem a uma imensa estrutura financeira para negociar esses ativos no mercado.
A alta demanda incentivou as instituições de crédito a ampliar sua “produção” e oferecer hipotecas com grande risco de calote — as famigeradas hipotecas subprime.
Quando muitos tomadores de hipotecas deixaram de pagar as contas, o mercado imobiliário foi inundado por imóveis desvalorizados e a estrutura entrou em colapso, levando à crise.
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O ápice da crise ocorreu em 15 de setembro de 2008 com a falência do Lehman Brothers, um dos maiores e mais antigos bancos de investimentos do mundo.
Os indícios da bolha já vinham crescendo desde 2007, quando dezenas de instituições ofertantes de hipotecas começaram a falir ou ser compradas por bancos maiores.
Em 2008, a crise se alastrou para outras instituições financeiras ao redor do mundo que tinham participação no mercado imobiliário norte-americano.
No mesmo mês da falência do Lehman Brothers, o tradicional banco Merrill Lynch foi comprado pelo Bank of America, enquanto o Goldman Sachs e o Morgan Stanley pediram crédito emergencial ao Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA).
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Em resumo, a crise do subprime foi causada pela disparada dos investimentos lastreados em hipotecas enquanto o risco de default destes empréstimos crescia exponencialmente.
Contudo, uma bolha econômica de proporções bilionárias não surge da noite para o dia, e tampouco passa despercebida por todos os agentes envolvidos.
Para entender como um mercado tão frágil cresceu tão rápido, é preciso contextualizar o momento da economia e os incentivos que levaram os agentes a agir de forma irracional.
A seguir, vamos analisar alguns fatores:
Entre o final da década de 1990 e o início dos anos 2000, o mercado imobiliário norte-americano estava fortemente aquecido.
As taxas básicas de juros encontravam-se em níveis baixos, tornando os empréstimos mais acessíveis para a população e facilitando o financiamento do setor de construção civil.
Além disso, os juros baixos costumam incentivar investidores de perfil mais conservador a buscar aplicações mais rentáveis do que as opções de renda fixa, como títulos públicos.
Em plena expansão do setor, o preço médio de uma residência nos EUA chegou a subir 124% entre 1997 e 2006, segundo um relatório da revista The Economist.
O crescimento veio acompanhado de um avanço da especulação imobiliária, ou seja, a compra de imóveis com o objetivo primário de revenda com a valorização.
A compra de residências para especulação nos EUA chegou a 40% em 2005, de acordo com a Associação Nacional de Agentes Imobiliários (NAR, em inglês).
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Até então, as hipotecas eram tradicionalmente vistas como um investimento rentável e bastante seguro, mas ainda restrito a grandes bancos e clientes com bom perfil de crédito.
Com o barateamento do crédito, fortaleceu-se a percepção da hipoteca como quase livre de riscos: no caso de não-pagamento, o credor tomava o imóvel do devedor e o revendia.
Vale ressaltar que a hipoteca não é intransferível; o banco que concede o financiamento pode vender o título para outra instituição, e o novo proprietário torna-se o credor.
Assim, ao passo que o crédito chegava a clientes de maior risco, crescia a prática de securitização, isto é, a transformação de “lotes” de hipotecas em ativos negociáveis no mercado financeiro.
Em pouco tempo, nasceu uma lucrativa indústria de derivativos de hipotecas — uma espécie de “fundos de hipotecas” que rendiam juros através de instrumentos financeiros complexos.
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Quanto mais rentáveis se tornavam os derivativos, mais incentivos os bancos tinham para conceder hipotecas e revendê-las a securitizadoras e corretoras.
Muitos bancos passaram a atrair clientes de menor renda com condições predatórias de empréstimo, que pareciam boas oportunidades, mas ficavam mais caras com o tempo.
Daí, surgiu o mercado das hipotecas subprime: financiamentos imobiliários de alto risco que eram revendidos ao mercado como opções seguras e rentáveis de investimento.
Estima-se que o total de ativos lastreados em hipotecas subprime tenha chegado a US$ 1,3 trilhão em 2007, segundo o Fed e a agência de rating Moody’s.
Como o mercado de derivativos de hipotecas era muito recente, a legislação dos órgãos de fiscalização dos EUA era pouco específica e bastante relaxada.
Além disso, as agências de ratings, responsáveis por avaliar o grau de risco dos investimentos, tomavam como base o histórico das hipotecas antes do estouro da bolha.
A carência de dados recentes levou diversas agências, como Moody’s e Fitch, a classificar muitas hipotecas subprime como “AAA”, a nota mais alta em termos de segurança.
Analistas afirmam, ainda, que havia uma cadeia de “terceirização” dos riscos — mesmo aqueles cientes do risco acreditavam que o prejuízo recairia sobre outros agentes.
Em 2011, o relatório da Comissão de Inquérito da Crise Financeira do Congresso resumiu os fatores que levaram à crise do subprime, afirmando:
“Os sentinelas não estavam em seus postos, devido à ampla crença na natureza autocorretora dos mercados e na habilidade das instituições financeiras de policiarem a si próprias.”
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Agora que já entendemos como ocorreu a crise do subprime, vamos elencar algumas das consequências.
Quando a bolha estourou, enormes bancos americanos encontraram-se subitamente endividados pelos empréstimos sem retorno e imóveis profundamente desvalorizados.
A falência do Lehman Brothers desencadeou o pânico nos mercados e um movimento massivo de vendas de ações. Em novembro de 2008, o índice S&P 500 despencou 45% abaixo da máxima em 2007.
Entre 2008 e 2009, o desemprego nos EUA passou de 5% para 10%. O PIB americano começou a se retrair no 3º trimestre de 2008 e só voltou a crescer no início de 2010.
Segundo estimativa do Fundo Monetário Internacional (FMI), os bancos americanos e europeus chegaram a perder US$ 2,8 trilhões em ativos entre 2007 e 2010.
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Em outubro de 2008, semanas após a falência do Lehman Brothers e o derretimento dos mercados, o governo dos EUA aprovou um programa de resgate de até US$ 700 bilhões.
O programa TARP (Troubled Asset Relief Program) previa a compra de ativos tóxicos dos bancos pelo governo, buscando conter o pânico nos mercados e salvar os bancos.
Além disso, em 2009, o Congresso aprovou um programa de estímulo fiscal que injetou mais de US$ 800 bilhões na economia.
Em 2012, a dívida pública do governo norte-americano superou 103% do PIB.
As medidas de estabilização financeira também foram adotadas na Europa, através de programas de resgate dos bancos com dinheiro público.
Apesar dos esforços para conter a recessão, a crise do subprime foi o estopim para a crise da dívida europeia que solapou as economias e cujos efeitos continuam sendo observados.
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A crise do subprime é considerada um dos gatilhos para a criação do Bitcoin, considerada a primeira criptomoeda funcional do mundo.
O manifesto publicado em 2008 por Satoshi Nakamoto, criador anônimo do Bitcoin, afirma que o problema com as moedas nacionais é a necessidade de confiança em bancos centrais e governos, e que “a história está repleta de exemplos de quebra de confiança”.
Por outro lado, não há menção explícita de Nakamoto à crise do subprime, o que leva estudiosos a questionar se o Bitcoin seria uma reação imediata à crise de 2008.
Independentemente do estopim para sua criação, a ascensão das criptomoedas na última década é atribuída em larga escala às falhas de governos em fiscalizar o mercado.
Indícios dessa teoria estão na valorização estratosférica do Bitcoin, que cresceu mais de 5.000.000.000% em valor desde 2010 e hoje vale cerca de US$ 40.800,00.
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Após o desastre econômico global do subprime, economistas vêm prestando cada vez mais atenção à possibilidade de uma nova bolha catastrófica na economia.
Nos EUA, considerando todas as variáveis que levaram ao surgimento e estouro da bolha, especialistas atribuem a responsabilidade amplamente à falta de regulação dos mercados.
Desde então, o governo e o banco central dos EUA vêm trabalhando ativamente para aumentar a transparência e a prestação de contas por parte do sistema financeiro.
Em 2010, o Congresso americano aprovou uma reforma fiscal conhecida como Lei Dodd-Frank, em homenagem ao deputado Barney Frank e ao senador Chris Dodd.
Algumas das medidas implementadas pela reforma são:
As reformas tiveram forte aprovação da população americana, e muitos acreditam que o novo sistema de fiscalização tem potencial para identificar uma crise antes que aconteça.
Porém, há divergências sobre a capacidade efetiva da reforma de evitar novos desastres e prevenir práticas predatórias, uma vez que a falta de regulação seria apenas um dos fatores que permitiram a crise do subprime.
Além disso, há um debate crescente sobre o risco apresentado pelas criptomoedas, que operam à margem da fiscalização, e sobre a existência de uma bolha do Bitcoin.
A crise de 2008 se disseminou pela cultura pop e deu origem a vários filmes sobre o assunto.
A Grande Aposta (2015) é provavelmente o mais famoso. Ele conta a história real de corretores que previram a crise e tentaram alertar autoridades ou enriqueceram com ela.
Se você quer entender em detalhes o que o filme mostra, vale a pena conferir a participação do nosso CEO, Tito Gusmão, no podcast “Era uma vez no oeste”:
Outros filmes conhecidos com a temática da crise do subprime são:
Neste artigo, você entendeu como a crise do subprime surgiu e quais impactos ela trouxe para a economia e o mercado financeiro.
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