Top-down e bottom-up são duas abordagens distintas que podem ser usadas na análise fundamentalista de ações.
Muitas vezes, são descritas como métodos antagônicos, cuja diferença é o ponto de partida da análise: um vai do geral (macro) até o específico (micro) e o outro do específico para o geral.
Embora essa visão não esteja incorreta, ela é limitada.
Na realidade, a diferença mais importante entre as abordagens top-down e bottom-up não é a ordem de observação dos fatores, mas sim a lógica por trás dos critérios de análise.
Neste artigo, vamos mostrar qual é essa lógica e em quais situações cada um dos modelos costuma ser usado.
Antes disso, explicaremos melhor o que é top-down e o que é bottom-up e apresentaremos alguns exemplos.
Partiu descomplicar o conceito de top-down e bottom-up? Boa leitura!
Indice
Os próprios nomes já ajudam a compreender: top-down quer dizer de cima para baixo, enquanto bottom-up é de baixo para cima.
A análise top-down ocorre quando o investidor olha primeiro para o quadro geral, observado fatores macroeconômicos, depois para as perspectivas dos setores da economia e, só então, para as empresas.
Já na abordagem bottom-up o analista tem uma empresa específica como o ponto de partida, observando seus fundamentos primeiro, e só depois analisa o mercado em que ela está inserida, além dos fatores macroeconômicos.
Então, enquanto na análise top-down cada etapa funciona como um filtro, que ajuda a chegar nas empresas que representam — em tese — as melhores oportunidades naquele momento, na bottom-up a empresa já está escolhida, e a investigação serve para confirmar se ela realmente representa uma boa aposta.
Pode parecer uma diferença sutil, mas a escolha entre análise top-down ou bottom-up depende bastante do perfil, da mentalidade e dos objetivos específicos do investidor.
Como vimos na abertura do artigo, cada método tem uma lógica diferente.
Resumindo bastante, podemos dizer que a análise top-down é usada para explorar oportunidades que acompanham os ciclos do mercado, enquanto a bottom-up é recomendada para quem investe com a estratégia buy and hold.
Nos tópicos seguintes, vamos detalhar melhor no que consiste cada uma das abordagens de análise, para que fique mais fácil entender as diferenças entre as top-down e bottom-up.
Mas, antes disso, vale repetir que tanto top-down quanto bottom-up são métodos usados na análise fundamentalista.
Isso quer dizer que os dois tipos de análise investigam uma série de fatores (e não apenas o gráfico com a variação do preço da ação, como a análise técnica faz) para avaliar as melhores opções de investimento.
O objetivo principal, no fim, será o mesmo: entender quais são as empresas cujas ações têm maior chance de se valorizar nos próximos anos.
O que acontece é que cada investidor pode ter sua ideia de qual a melhor maneira de encontrar essas oportunidades — e aí surgem as diferentes abordagens de análise.
LEIA MAIS | Como analisar uma ação: passo a passo simplificado
Top-down é uma abordagem de análise de ações que começa pela observação de fatores abrangentes. O investidor começa a busca pelos melhores ativos com a análise do quadro completo, para depois buscar informações mais específicas antes de tomar sua decisão de investimento.
Focando inicialmente na macroeconomia, identifica-se os fatores que estão afetando a economia como um todo. A partir daí, deve-se analisar quais setores apresentam as maiores oportunidades.
E o que são os tais fatores macroeconômicos? São aspectos que impactam o grande cenário (do país e, em maior ou menor escala, do mundo).
Alguns dos principais fatores macroeconômicos são:
É interessante observar que a análise top-down pode ser usada para tomar decisões de investimento em um contexto mais amplo, e não apenas dentro das possibilidades da Bolsa de Valores.
Por exemplo: entre 2014 e metade de 2017, a taxa Selic, um fator macroeconômico, estava acima de 10% ao ano, o que tornava investimentos de renda fixa como os títulos do Tesouro Direto praticamente irresistíveis, pois garantiam boa rentabilidade e baixo risco.
No mercado de ações, a análise dos fatores macroeconômicos direcionam a observação do investidor aos setores com maior chance de prosperar dentro do cenário que se apresenta ou se aproxima.
LEIA MAIS | Selic hoje: confira o valor atual da taxa Selic
A análise top-down começa com o estudo dos fatores macroeconômicos. Não apenas do Brasil, mas também dos principais países com que as empresas brasileiras fazem negócio.
Se o PIB brasileiro está parado ou em queda, mas a economia das maiores potências asiáticas cresce, pode ser um fator positivo para companhias que atendem a esses mercados.
O exemplo acima, porém, leva em conta apenas um fator. Cada aspecto macroeconômico tem sua importância em particular, mas o conjunto da obra é que deve ser levado em conta.
Aqui, é essencial ter algum conhecimento sobre a dinâmica do mercado e do consumo para entender quais os setores são beneficiados na atual conjuntura.
Em muitos casos, a análise top-down não é usada para descobrir oportunidades em nichos específicos, mas sim para priorizar a alocação dos recursos entre dois grandes grupos: essenciais e não essenciais.
A ideia é que, quando a economia do país vai bem, os consumidores tendem a comprar mais itens não essenciais — em categorias como moda, automóveis, móveis e itens de decoração, lazer, eletrônicos, arte e entretenimento e materiais de construção.
Se a economia vai mal, com desemprego e inflação em alta, teoricamente há uma queda no consumo desse tipo de produto ou serviço.
Já o consumo de itens essenciais — áreas como alimentação, saúde, higiene, limpeza e serviços de transporte — não varia tanto, em tese. Afinal, como o próprio nome já diz, não se pode viver sem eles.
Assim, investidores que usam o método de análise top-down costumam apostar mais em empresas que produzem itens não essenciais quando o ciclo econômico é positivo e em companhias que fabricam itens essenciais em momentos de recessão e crise.
Desse modo, a análise top-down tem uma relação muito próxima com a estratégia factor investing, que usa filtros (fatores macroeconômicos e outros, mais específicos) para decidir quais os melhores ativos para investir.
LEIA TAMBÉM | Análise vertical: o que é e como fazer na prática [com exemplos]
Bottom-up é uma abordagem de análise de ações em que o investidor observa as características e os fundamentos de uma empresa específica. Neste método, os fatores macroeconômicos e cenário do setor em que a empresa atua têm menos importância.
A ideia é que, se uma empresa é bem gerida, tem indicadores positivos, bons produtos e colocação favorável no mercado, tende a performar bem no longo prazo.
Nesse caso, portanto, os ciclos econômicos e aspectos como inflação e taxa de juros não devem pesar tanto na decisão de investimentos, pois sua flutuação não impacta de forma tão relevante na saúde futura da companhia.
O investidor que utiliza a abordagem bottom-up pode analisar fundamentos como:
Vale lembrar que, apesar de não serem os critérios mais importantes, os fatores mais abrangentes não devem ser completamente ignorados.
Uma análise fundamentalista completa deve olhar para o quadro geral também.
O segredo é compreender quais desses aspectos são mais importantes de acordo com a sua estratégia.
Se o objetivo é resgatar o dinheiro daqui a 15 anos, não faz sentido se preocupar tanto com fatores como taxa de juros e índice de inflação de curto prazo, já que eles vão flutuar bastante nesse período.
A não ser que a conjuntura atual represente um risco iminente de falência — se esse for o caso, porém, a análise dos fundamentos da empresa provavelmente já indicará que investir em suas ações é um risco muito grande.
LEIA TAMBÉM | Segmentos de listagem da Bolsa: conheça todos e compare as diferenças
Imagine que você está cogitando investir nas ações da Lojas Renner. Seguindo a lógica top-down, esse não seria o melhor momento, já que o cenário econômico atual no Brasil é negativo, a inflação está em alta e a moda é uma categoria não essencial.
Mas sabemos que a pandemia um dia vai terminar e as pessoas voltarão a frequentar as lojas da rede para experimentar e comprar roupas.
No longo prazo, portanto, são os fundamentos da Lojas Renner que ajudam a entender se o investimento é promissor.
Consultando o último balanço anual divulgado pela companhia, observamos que ela tem um patrimônio líquido de R$ 5,5 bilhões e 393 lojas funcionando (entre Renner, Camicado e Youcom).
Esse tipo de informação pode ser comparado com os números de concorrentes do setor para ter uma ideia da dimensão da Lojas Renner dentro de seu mercado.
O investidor pode seguir com a análise dos múltiplos da empresa e outros aspectos de seus demonstrativos financeiros.
LEIA MAIS | Valuation: como descobrir o valor de uma empresa e quais cuidados tomar
Com as explicações e os exemplos que apresentamos neste artigo, esperamos que tenha ficado claro que a diferença entre top-down e bottom-up é muito mais do que a ordem de análise dos fatores.
Estamos falando de abordagens que, geralmente, são utilizadas em estratégias de investimento distintas.
Enquanto a lógica da top-down é explorar os ciclos econômicos para encontrar oportunidades, na bottom-up a ideia é priorizar companhias sólidas, independentemente da conjuntura de seu setor.
Se a atividade principal de uma empresa depende de matéria-prima importada e o dólar está em alta, essa companhia talvez nem seja considerada como opção de investimento em uma análise top-down.
Isso quer dizer que a abordagem top-down é mais segura e confiável?
Não, apenas que é mais adequada em determinados contextos. Fundos de investimento, por exemplo, costumam atualizar o portfólio de ativos de acordo com as particularidades de cada ciclo econômico.
Mas um investidor individual pode apostar no buy and hold e, com uma boa análise e carteira de investimentos diversificada, terá uma boa segurança quanto à rentabilidade do dinheiro aplicado.
Então, quando utilizar top-down e quando usar bottom-up? Depende de qual seu perfil de investidor e objetivos.
Top-down e bottom-up são duas abordagens distintas para analisar uma empresa e decidir se vale a pena investir em suas ações.
A primeira segue a ordem “de cima para baixo”, priorizando o quadro geral e fatores macroeconômicos.
Na segunda, a análise é feita “de baixo para cima”, começando pelos fundamentos de uma empresa específica.
Nossa dica final é não ser um seguidor tão radical de um método ou de outro, enxergando a complementaridade que existe entre eles.
Ou seja, não desconsidere os fundamentos da empresa em uma análise top-down e não ignore os fatores macroeconômicos ao utilizar a abordagem bottom-up.
Assim, você terá uma análise fundamentalista completa, aumentando as chances de ter uma boa rentabilidade e reduzindo os riscos.
Gostou do artigo? Confira outros conteúdos que separamos para você: